3.1.10


"No ofício poético, sendo um ofício nocturno - no sentido em que acentua umas dimensões da existência em detrimento de outras - há detalhes, há elementos, há factores diurnos da vida utilitária, da vida corrente, que são recolocados de outra forma em nome desse processo de visitação, de hospitalidade, que é a poesia. Um processo em que o homem é hóspede de si. Em que nos acolhemos a nós mesmos, na nossa palavra e nosso silêncio. Esse trabalho é um trabalho sempre próximo do canto. Todo este trabalho - que é todo ele um ofício do silêncio - é em função de uma voz que se torna irreprimível e que do silêncio alcança, às vezes por uma ponte de cordas suspensa num abismo, o possível da palavra."

"O silêncio também tem a ver com a noite. Há um tipo de silêncio que só a noite tem. Um silêncio onde sentimos o próprio mundo, onde sentimos o tempo de uma outra forma. Esse silêncio interessa-me muito como lugar de visibilidade. Penso que a noite é um lugar onde se vê melhor o próprio silêncio."

"Penso que a função da poesia é reabilitar o silêncio, é perfurar o ruído - o ruído que somos, o ruído que nos cerca - até encontrarmos camadas substerrâneas do silêncio."

"O silêncio é um caminho. Não basta, por exemplo, estarmos calados para estar em silêncio. Podemos estar calados e o rumor ser ensurdecedor. Há uma qualidade do silêncio que é uma conquista, que é um processo em que nós entramos."
José Tolentino de Mendonça (JTM) a Carlos Vaz Marques, na Revista Ler de Dezembro

1 comentário:

maria joao regala disse...

Olá Pris! Estás aí tão longe, mas andamos sintonizadas. Tudo a ler o Tolentino de Mendonça, que é nem mais nem menos do que uma das pessoas que estamos a tentar convidar para o nosso projecto sobre o silêncio, a realizar em Abril. Que milhões de coisas nos põe a pensar, não é?