13.8.07

Inquérito Nacional de Saúde

O Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge e o Instituto Nacional de Estatística apresentaram este Agosto os principais resultados do 4º Inquérito Nacional de Saúde (2005-2006). Para além do que transbordou para a comunicação social, nomeadamente dados sobre a alarmante obesidade e sobre os hábitos tabágicos e alcoólicos crescentes da população portuguesa com mais de 15 anos, o referido inquérito recolhe também indicadores ao nível da saúde mental.

O que se divulga agora são números redondos que aguardam ainda tratamento e análise pormenorizados. Portanto o que ficamos a saber (ou já sabíamos) é que 27,6% da população residente com 15 e mais anos enquadra-se no grupo de pessoas com provável sofrimento psicológico, destacando-se sobretudo as mulheres com 36,8%, enquanto que, 17,6% de homens se encontram nesta situação.

Estes números trazem-me à memória outros, de que já falei, o tal 1,5% da população portuguesa que tem acesso a serviços públicos de saúde mental. O senhor ministro da saúde, ao corrente destes factos, propôs-se, há uns meses atrás, com mais umas comissões de peritos e planos nacionais para tudo, atacar este "problema de acessibilidade grave".

Mas tanto quanto sei e a crer no Comunicado do Sindicato Nacional dos Psicólogos (SNP) de 10.08.2007, o ataque do senhor ministro vai em sentido contrário, atropelando tudo e todos, utentes, famílias e técnicos. Um terço dos psicólogos do Hospital Miguel Bombarda foi despedido de um dia para o outro e os utentes viram os seus tratamentos interrompidos sem explicação nem alternativas. Tudo se insere, ao que parece, na preparação de encerramento dos hospitais psiquiátricos do país e na progressiva transferência desses cuidados para os hospitais gerais e outros serviços. Assim, e à semelhança do que sucede com urgências e maternidades, primeiro fecha-se e depois logo se vê!

Resumindo (pego nas palavras do SNP):
- tem havido uma "redução drástica dos recursos de saúde mental disponibilizados";
- tem havido "interrupção forçada dos processos terapêuticos em curso, colidindo com os princípios éticos e deontológicos da profissão, assim como com os direitos dos utentes";
- tem havido "extinção de consultas de Psicologia em serviços de especialidade";
- há apenas 40 psicólogos nos quadros dos serviços de saúde mental públicos; não abrem concursos no continente para Técnico Superior de Saúde, da carreira de Psicologia Clínica desde 2001 e para as escolas desde 1997. Os restantes técnicos (indispensáveis para assegurar necessidades permanentes dos serviços) exercem em regime precário, voluntário ou estagiário.

Utentes e técnicos são duas faces da mesma moeda, uma moeda que o senhor ministro pretende chutar para os privados. É o direito à saúde que está em causa!

Isto vai mal...

7.8.07

Hei-de ver-me na escrita para não morrer


"Veio-me a vontade de escrever quando à força de medicamentos me obrigaram a calar, uma luta. Veio-me a vontade de olhar para mim quando ao chegar àquele hospital me disseram, tu não existes, tu és louca, quando me obrigaram a desaparecer numa camisa branca grande demais para mim. Sonho mirar-me num espelho. Tiraram todos os objectos cortantes e o espelho. O mais duro dos castigos não poder ver-se ao espelho. Encho uma bacia de água e olho-me nela. Olho-me durante muito tempo, miro-me e remiro-me vezes sem conta. Hei-de ver-me na bacia imunda que vai de louco em louco, água suja. Hei-de ver-me na minha própria baba.

Hei-de ver-me na escrita para não morrer."

Emma Santos, O Teatro