5.1.10


"Morre lentamente quem não viaja,
Quem não lê,
Quem não ouve música,
Quem destrói o seu amor-próprio,
Quem não se deixa ajudar.

Morre lentamente quem se transforma escravo do hábito,
Repetindo todos os dias o mesmo trajecto,
Quem não muda as marcas no supermercado,
não arrisca vestir uma cor nova,
não conversa com quem não conhece.

Morre lentamente quem evita uma paixão,
Quem prefere O "preto no branco"
E os "pontos nos is" a um turbilhão de emoções indomáveis,
Justamente as que resgatam brilho nos olhos,
Sorrisos e soluços, coração aos tropeços, sentimentos.

Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz no trabalho,
Quem não arrisca o certo pelo incerto atrás de um sonho,
Quem não se permite,
Uma vez na vida, fugir dos conselhos sensatos.

Morre lentamente quem passa os dias queixando-se da má sorte ou da Chuva incessante,
Desistindo de um projecto antes de iniciá-lo,
não perguntando sobre um assunto que desconhece
E não respondendo quando lhe indagam o que sabe.

Evitemos a morte em doses suaves,
Recordando sempre que estar vivo exige um esforço muito maior do que o
Simples acto de respirar.
Estejamos vivos, então!»

Pablo Neruda

3.1.10


"No ofício poético, sendo um ofício nocturno - no sentido em que acentua umas dimensões da existência em detrimento de outras - há detalhes, há elementos, há factores diurnos da vida utilitária, da vida corrente, que são recolocados de outra forma em nome desse processo de visitação, de hospitalidade, que é a poesia. Um processo em que o homem é hóspede de si. Em que nos acolhemos a nós mesmos, na nossa palavra e nosso silêncio. Esse trabalho é um trabalho sempre próximo do canto. Todo este trabalho - que é todo ele um ofício do silêncio - é em função de uma voz que se torna irreprimível e que do silêncio alcança, às vezes por uma ponte de cordas suspensa num abismo, o possível da palavra."

"O silêncio também tem a ver com a noite. Há um tipo de silêncio que só a noite tem. Um silêncio onde sentimos o próprio mundo, onde sentimos o tempo de uma outra forma. Esse silêncio interessa-me muito como lugar de visibilidade. Penso que a noite é um lugar onde se vê melhor o próprio silêncio."

"Penso que a função da poesia é reabilitar o silêncio, é perfurar o ruído - o ruído que somos, o ruído que nos cerca - até encontrarmos camadas substerrâneas do silêncio."

"O silêncio é um caminho. Não basta, por exemplo, estarmos calados para estar em silêncio. Podemos estar calados e o rumor ser ensurdecedor. Há uma qualidade do silêncio que é uma conquista, que é um processo em que nós entramos."
José Tolentino de Mendonça (JTM) a Carlos Vaz Marques, na Revista Ler de Dezembro